BREVE REFLEXÃO SOBRE A REALIZAÇÃO HUMANA

Um dos principais objetivos da terapia com a psicanálise é auxiliar o paciente a encontrar-se a partir do desvelamento das suas ações inconscientes, através do acesso a um maior conhecimento a respeito de si mesmo, ao conteúdo que configura o indivíduo para além do que ele próprio pensa a seu respeito. Trata-se de um processo de saída da representação idealizada que ele forma sobre o Ego para a compreensão daquilo que ele é na realidade. Esse desvelamento se torna importante, na medida em que durante nosso processo de inserção social, quando recebemos os ensinamentos para conseguirmos conviver com as demais pessoas, vamos registrando uma série de impressões da sociedade, juntamente com representações que formulamos sobre nós mesmos, as quais normalmente servem para encobrir nossas principais características e, se não forem trazidas à luz da consciência, nos condenam a uma existência repleta de equívocos e, muitas vezes, perturbada. Essa constatação levou o psicanalista Carl Jung a afirmar que “nós nascemos originais e morremos cópias”. Com isso ele nos chamava a atenção para o fato de que ao sermos colocados a viver em sociedade, vamos adotando seus códigos de conduta e comportamentos, aprendendo, através do processo de educação ao qual somos expostos, a como moldar nossos instintos, com o intuito de tornar possível a convivência com o outro. Durante esse processo de moldagem ao qual nos submetemos, fatalmente vamos deixando fragmentos do nosso eu original, trocando-os por outros fragmentos que passam a constituir uma nova roupagem de nós. Nos tornamos outra pessoa, a qual, na maioria das vezes, não é reconhecida nem mesmo por nós.

O pensamento sobre esse assunto nos conduz à constatação de que a partir da ideia de que muitas vezes precisamos negar a nossa própria essência para nos adequar às exigências da sociedade, nos entregamos a um processo de desconstrução de nós mesmos, obtendo um efeito contrário daquilo que buscamos, ou seja, adoecemos psiquicamente na ânsia de conseguir a salubridade em nossas relações sociais.

Nosso objetivo aqui é provocar uma reflexão sobre o que resta da pessoa original que hoje habita aquilo que você considera o seu “Eu”. Tal reflexão, se aprofundada, pode te ajudar a se livrar de um processo muito comum nos dias atuais, sendo um dos grandes responsáveis pelo adoecimento psíquico que é o processo de negação do verdadeiro eu. Embora exista todo um discurso que o aponta como o responsável por construir seu ideal de realização e que o impulsiona a correr atrás daquilo que possa torná-lo realidade, o fato é que o homem de hoje talvez sequer saiba querer, desejar no mais profundo da sua alma. Somos seres que nos reconhecemos incompletos, e que, na tentativa de encontrar nossa completude, nos inspiramos em fragmentos daquilo que julgamos conhecer sobre as pessoas que normalmente admiramos e com os quais buscamos algum ponto em comum. Corremos atrás de sonhos que não construímos, para chegar a um objetivo que também desconhecemos, sem considerar os custos que normalmente pagamos com tais buscas, com sério risco de chegar ao final da nossa jornada existencial totalmente desfigurados, adoecidos e infelizes.

A conclusão que essa reflexão pode nos possibilitar, é que se torna cada vez mais urgente buscarmos dentro de nós as respostas para as questões relativas aos nossos ideais, procurando descobrir o que de fato nos torna felizes e realizados. Isso nos possibilitará canalizar nossa energia em direção à plena realização de objetivos que sejam de nossa autoria, possibilitando-nos assim a oportunidade de atuarmos de forma mais autônoma na construção do ser humano que desejamos de fato nos tornar. Somos os principais responsáveis por construir o ser humano que projetamos em nós. Esta é uma constatação que não podemos ignorar, sob pena de desperdiçar nossa existência com uma vida vazia de significados. O primeiro passo em direção a essa construção é a tomada de consciência, seguida da ação de partir em direção ao autoconhecimento e a afirmação em seus verdadeiros valores e perspectivas de vida. Que tal iniciar esse processo agora?